Ultimamente tenho feito um caminho contrário dos muitos leitores de quadrinhos brasileiros. Enquanto uns correm- desesperados!- por um desconto em algum site acerca dos seus interesses mais nervosos, eu virei caçador de diversão! Compro quadrinhos quase initerruptamente desde 1994. Minha primeira coleção "séria" foi Super-Homem da editora Abril. Peguei a edição de número 117 do personagem e desde então me apaixonei por ler e colecionar quadrinhos. Não é um hobby fácil, principalmente nos dias de hoje. Virou uma diversão cara e por muitas vez (infelizmente) inflacionária e especulativa. Existe uma necessidade vaidosa de mostrar o "produto", exacerbar o luxo, "mostrar que tem", encorpar as capas, gramaturas e volume de páginas. A formação dos novos leitores tem sido um condicionamento quase explícito, onde ele é bombardeado com palavras-chave como "capa dura", "essencial", "clássico absoluto", "fase de sucesso", "grandes autores" e por aí vai. Já o leitor mais antigo ele vê uma oportunidade de ter seu quadrinho favorito em um formato melhor ou mais completo, mas sem necessariamente exigir um acabamento mais luxuoso. O leitor mais maduro, aquele que é mais exigente, que enxerga no acabamento mais caro uma chance de ter seu quadrinho de forma definitiva, geralmente exige esse formato como único pelo conteúdo mais encorpado e derradeiro- mas isso não é uma prática só do "maduro". Aquele leitor "condicionado" também está ligado aqui, afinal, esse é o formato que lhe foi apresentado e "baixar o nível" é um retrocesso.
A Arte & Ciência é um dos mais recheados localizado próximo a Universidade Federal do Ceará
Houve um tempo, ali por volta de 2012 e 2018 que eu comecei a achar que o melhor formato, aquele mais assertivo era a capa dura. Naquele tempo, a editora que melhor investia nessa vertente com ótimo custo/benéfico eram as editoras Salvat e Panini. Chegou a se fazer uma diferença tão pálida de valor entre os formatos capa cartão e dura que era vantagem pegar a edição mais "luxuosa". Meu olhos cresceram para o formato e comecei a me desfazer de grandes gibis da Abril como Cavaleiro das Trevas e Watchmen em minisséries e pegar as edições em capa dura- anos mais tarde me arrependi amargamente e penei pra pegar de volta sem precisar vender um rim! Com o passar dos anos e a popularização da capa dura e na sequencia de sites com promoções e descontos convidativos (Saraiva e Amazon disputavam quem dava o desconto mais chamativo), a capa dura virou um padrão corriqueiro entre lançamentos e foi rapidamente virando "lugar comum" entre as novidades. E esse foi a primeira grande rachadura nesse reino de felicidade do couchê e papelão.
Fachada da Antiga loja Fanzine em Fortaleza
A primeira grande alavancada aconteceu quando o preço de capa das edições de luxo deram um salto vertiginoso de quase 50% para qualquer lançamento, seja qual personagem fosse. A comoção entre os leitores gerou uma onda de "hate" contra a editora Panini- que tinha e tem o maior volume de publicações- chegando a mudar drasticamente a forma de comunicação da editora com resquícios até hoje! Isso aconteceu ali quando Arqueiro Verde: A Queda em Os Novos 52 com 128 foi lançada por um valor absurdo (até pros dias de hoje) em abril de 2020 por R$ 51,00. Nessa época as edições nesse formato e com essa média de páginas gerava em torno de R$ 29,90. Mas foi sendo percebido que outras edições vinham tendo aumentos constantes e quando essa edição do Arqueiro saiu foi a gota d´água. Depois disso o mercado nunca mais foi o mesmo.
A Mandrake em Goiânia tem material recente e antigos também
O cenário foi mudando drasticamente no campo econômico mundial. Tivemos uma crise global que levou a uma recessão braba que durou alguns anos para ser aliviada e na sequencia uma pandemia que foi um banho de água fria numa ainda morna recuperação econômica. Essas "forças do acaso" forçaram muitas empresas a mudarem seu formato de trabalho e isso vale para o mundo do entretenimento. Aqui as editoras apostaram naquela semente plantada no começo com a popularização do luxo para dar passos ainda mais ousados com edições chamada de "Definitivas", Deluxe" e edições "Omnibus"- o passo final para as definitivas. Ou não! Afinal, as "Edições Absolutas" são um nível de luxo que se pode comparar ser maior em termos de última palavra para um gibi realmente de imponente independente do número de páginas.
Outra opção é a Comic Boom que fica em Tatuapé, São Paulo
Essa visão cada vez mais espalhafatosa, essa busca pelo "supra supremo"... me deu um estalo providencial para acordar desse mundo de fantasia onde achar que Omnibus, Absolutes e termos assim são realmente necessários. O intuito do quadrinho é uma diversão simples; vinte minutos de ação, aventura, amor, terror, ficção científica ou o que ele puder te dar em 22 páginas. É um formato que você pode levar num ônibus, colocar na mochila, ler numa fila, desfrutar em qualquer ambiente e até dobrar e colocar no bolso (não faça isso!) se quiser! Acompanho canais diversos e é incrível o número de "influenciadores" que exacerbam o formato e editoras sem realmente fazer o papel de apoiar o leitor de fato. E foi numa dessas que percebi o quanto o Sebo é importante. Há algum tempo tenho feito minhas maiores e melhores compras em sebos- a maioria online e o prazer de conseguir edições soltas, minisséries e até completar coleções é impressionante. Aliás, trocar minhas edições em capa dura por versões mais simples é praticamente uma lavagem de alma! O alfarrabista- que termo bonito- tem um papel de resgate e de te proporcionar algo que não se consegue ter nesse tapete vermelho artificial que foi colocado os gibis: o prazer de pegar a História! Cada compra nova me joga numa época onde o luxo era um formato americano, papel LWC e capa simples. Pronto! Era isso! E pra mim aquilo era um produto que eu só podia ver na banca e não ter em casa.
Loja com material recente e um ótimo sebo é a Tutatis em Porto Alegre, RS.
O papel do Sebo dentro do mercado é importante por muitos fatores e não apenas o de achar um livro, revista ou gibi mais barato, mas o de movimentar a publicação impressa, ser a artéria de um tempo em que a publicação de redação física gerava um comercio sadio nas bancas com leitura pra todos os tipos e gostos. Só quem viveu aquele clima sabe do que falo: entrar numa banca e ter aquele cheiro de tinta boa nas narinas. Olhar pra prateleira e ver não apenas gibis, mas revistas de cinema, ciências, curiosidades, agropecuária, fofocas, entretenimentos cotidianos, politica, e uma gama enorme de variedades. Em minhas buscas pelos sebos virtuais, também me deparo com artigos ratos e com valores bem elevados. Normal para uma demanda tão específica, mas também me deparo com muitos especuladores. Infelizmente há uma parcela de vendedores que se aproveitam da raridade do produto pra explorar de forma vergonhosa! Ser uma artigo raro e valer mais acho normal. Mas há alguns que extrapolam com números muito fora da curva.
Um sebo muito conhecido em Fortaleza é o sebo Albaniza
Hoje tenho conseguido em sua maioria com boa pesquisa pegar tudo que quero com valores bem módicos, mas já precisei pagar um pouco mais por um item pra fechar uma coleção. Mas pra mim o caminho da satisfação como leitor de quadrinhos foi recuperado aqui! Não sou totalmente contra versões de luxo em capa dura ou com mil páginas, mas o atalho me incomoda. De eu não poder escolher a versão que melhor se adeque ao meu gosto pessoal. Na maioria das vezes só há a opção luxo. Pode ser que no futuro me interesse por essas versões de envergar prateleiras, mas no momento, meu interesse é praticamente zero.
A Ravena é uma tradicional loja de quadrinhos de Fortaleza com um sebo de qualidade