
- Alô?
- Mãe? Sou eu... Luciana. Como a senhora tá? Abença...
- Ah, minha filha. Deus te abençoe. Eu estou bem. Mas nem é final de semana. Por que ligou? Precisa de alguma coisa? Advinha quem vem para cá hoje? Sua tia Cristina. Por isso estou preparando um bolo.
- Que legal, mãe. Escuta... o pai tai?
- Não, por que, minha filha?- Dona Rosália já começa atenuar a sua atenção.
- É que...- Luciana pensa um pouco e faz silêncio.
- É alguma coisa na faculdade? Você está bem nas matérias? Sei que uma faculdade longe de casa, aí em São Paulo complica pra você, mas se quiser voltar, pode falar. Eu mando o dinheiro. Depois eu me entendo com o seu pai. Aqui tem ótimas faculdades também, meu amor. Num sei que invenção foi essa sua e de seu pai.
Luciana continua em silencio. Dona Rosália puxa uma cadeira que estava na mesa do lado, retira o avental e o coloca no encosto de outra cadeira, mas sem desgrudar o telefone da orelha. E quando ia novamente fazer a pergunta se Luciana estava bem, a própria corta a conversa e vai direto ao assunto que a fez telefonar para a casa dos pais no meio da semana, coisa que geralmente não faz.
- Estou grávida.
Silencio do outro lado. O coração de Luciana quase pára. Ela tinha saído de casa estava com apenas oito meses para estudar na UNICAMP no curso de Artes Cênicas. Vive numa república junto com amigas. Sonhava em estudar e se concentrar apenas nisso. Mas entre o planejamento e o destino, algo sempre fica incerto.
- Você está o que, Luciana? - fala Dona Rosália ainda em choque.
- É... eu, bem... aconteceu, mãe. Eu... esse rapaz...nós...
- Deus, Luciana! Você sabe--você sabe o que fez, menina?
- Mãe. Isso não vai atrapalhar meus estudos. Eu posso... – Luciana nem continua.
- Você vai voltar agora pra cá.
- Como é que é, mãe? Não mesmo. Eu vou terminar meus estudos. Vim pra cá pra isso. Sabe como é difícil passar no vestibular daqui?
- Quem é o pai?
- Só quero que saiba que eu não vou voltar. Não vai ser uma... uma barriga que vai me impedir de estudar, ora essa!
-Quem é o pai dessa criança?
- Eu --
- Quem é o pai dessa criança, Luciana? Mas que merda. Você tem 18 anos.
- Ele... eu... bem... é complicado.
- Mas não foi complicado na hora de ir pra cama, né? Logo você, minha filha. Uma moça tão esclarecida.
-Mãe! Aconteceu. Foi numa calourada. Ele... sabe quando um homem olha pra você com...
- Luciana! Não quero saber do seus... – Dona Rosália interrompe e continua- Esse rapaz vai assumir pelo menos?
- Eu não sei quem é.
- O que?-Dona Rosália quase pula pelo telefone no pescoço da filha. Não era esse o futuro para a qual ela havia sonhado. Planejado para a única filha. Já foi difícil deixá-la morar longe.
- Seu pai vai passar por aí na volta. Ele está em Florianópolis fazendo uma entrega. Vou ligar pra ele agora.
- Eu não vou...
- Você não tem o que querer. Acabou sua vida aí. Pensa que é quem? Negativo, Luciana. Você volta e ponto final. Depois falaremos sobre o possível pai dessa criança, sua irresponsável. Arrume suas coisas. Você vai voltar.
A chuva entrou noite a dentro e continuou assim.
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